
Um dos líderes da Força Tarefa da Lava Jato, procurador Deltan Dallagnol, chamou ontem atenção para uma aberração. Entre os 180 acusados criminalmente nas várias operações, apenas 8% continuam presos. O problema concreto é: muitos roubos continuam, em vários setores da administração pública federal, estadual, municipal e "estatal", com pouca gente efetivamente sendo punida pela roubalheira. Dallagnol não pode admitir abertamente, mas o excelente trabalho da equipe do Ministério Público Federal continua atuando sobre os efeitos - e não sobre as causas sistêmicas da corrupção.
Não foi à toa que Deltan Dellagnol advertiu ontem que a mudança de governo não deve ser vista pela população como um caminho para o fim da corrupção. O procurador ressalta que apenas mudanças na legislação poderão resultar num país melhor: "Vivemos um momento muito especial na história do país e nos preocupa que uma parcela da população veja a mudança de governo e mesmo as ações da Lava-Jato como meio caminho contra a corrupção. Nós não concordamos com essa visão. A corrupção não é privilégio nenhum de um partido A ou partido B. A corrupção ocorreu ao longo de toda a história, é sistemática, endêmica".
Dallagnol tentou interpretar o discurso dos críticos do trabalho do MPF na Lava Jato: "É importante perceber que pessoas que defendem o impeachment, assim como pessoas que não querem o impeachment, alegam perseguição. A nossa investigação é técnica, imparcial e apartidária. O Ministério Público é uma organização independente. A defesa usada é a defesa de desconstrução das investigações. É uma defesa política das investigações, porque a defesa jurídica acaba se revelando não muito profícua".
Deltan tem muita razão. O problema é o cinismo pragmático do brasileiro, sobretudo dos políticos. O discurso deles e o que ousam colocar no papel aceitam qualquer inverdade. Vide o texto “A travessia social”, de 17 páginas, no qual Michel Temer se compromete com a manutenção da Operação Lava-Jato e propõe a aprovação de uma lei que responsabilize de forma mais rígida e clara os dirigentes das estatais: “Muito do que deve ser feito já está proposto e, com algum esforço político, pode ser rapidamente transformado em legislação. Um conjunto de novas leis deve ser aprovado com o objetivo de estabelecer regras estritas de governança”.
O documento do PMDB se compromete a garantir recursos para Polícia Federal e Receita Federal continuarem trabalhando “no combate ao crime”: “As lições que estamos vivendo hoje nos obrigam a buscar a reengenharia das relações do Estado com o setor privado e reduzir ao mínimo as margens para a transgressão e o ilícito (...). A obrigação de qualquer governo responsável é responder a esta demanda da sociedade com uma nova postura ética”.
Voltando à Lava Jato, ainda há muito que fazer. O trabalho do Ministério Público Federal já recuperou R$ 2,9 bilhões em contratos da Petrobras. O montante representa quase 50% dos R$ 6,4 bilhões em propinas identificadas pela operação em contratos da estatal. O MPF já pediu o pagamento de R$ 37,5 bilhões de multas e ressarcimentos. O prejuízo causado à estatal pelo esquema de propinas pode chegar a R$ 42 bilhões.
Ou seja, todo mundo sabe e percebe facilmente que a corrupção sistêmica rouba os recursos que pagamos em 93 impostos, taxas, contribuições e infindáveis multas e instruções normativas no excessivo regramento da burocracia tupiniquim. Por isso é que não dá para levar muita fé no que promete Michel Temer (até recentemente aliado e coordenador político do desgoverno petista). Em entrevista ao SBT, Temer pregou que sua principal preocupação, caso assuma a Presidência, será adotar medidas econômicas para que o Brasil volte a crescer e para reduzir o desemprego: "Não fale em crise. Trabalhe ou invista. Esta é a mensagem que eu penso que o Brasil precisa".
Temer propagandeia um choque de confiança. Na listinha de promessas, aparecem: a reforma da Previdência, com a idade mínima de 65 anos para aposentadoria, a desvinculação do Orçamento, a desindexação dos benefícios sociais da variação do salário mínimo e a flexibilização do mercado de trabalho - com a proposta de mudança da Consolidação das Leis Trabalhistas (CLT). As centrais sindicais não concordam com tal programa. A maioria da população, também não. Logo, Temer tem problemas imediatos, antes mesmo de assumir.
Só a caída Dilma tem mais problema que Temer - cujo nome foi citado quatro vezes pelos delatores da Lava Jato. Um rolo programado pode sobrar para os dois. A Procuradoria Geral da República pedirá o fim do sigilo na delação de executivos da Andrade Gutierrez. Eles relataram pagamentos ilegais às campanhas de Dilma e de seu vice Temer, nos anos de 2010 e 2014. A PGR só não definiu se fará isso antes ou depois da decisão sobre o quase certo impeachment da Presidenta...
Resumindo: Temer não tem condições práticas de assumir e ter a certeza de que chega até o final do eventual mandato, em 2018. As velhinhas de Taubaté do rentíssimo e do empresariado tupiniquim seguem acreditando que tudo de bom vem com Temer. A Petelândia promete muita confusão, fazendo o que sabe de melhor: oposição desleal e violenta. É neste clima que a Dilma vai perder as olimpíadas. E nós, os otários, vamos ganhar a medalha de lata nas olim-piadas...
O sábio cavalo tem razão em fugir do assalto. Os burros deveriam fazer o mesmo...
Por: Roberto Tomé