Senado aprova projeto que altera Lei de Abuso de Autoridade

O Plenário do Senado aprovou nesta quarta-feira (26) o substitutivo ao projeto de lei que modifica a Lei de Abuso de Autoridade. O texto, do senador Roberto Requião (PMDB-PR), abrange atos que podem ser cometidos por servidores públicos e membros dos três poderes da República, do Ministério Público, dos tribunais e conselhos de contas e das Forças Armadas. Ele segue para a Câmara dos Deputados.
O substitutivo de Requião ao PLS 85/2017, do senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP), prevê mais de 30 ações que podem ser consideradas abuso de autoridade, com penas que variam entre seis meses e quatro anos de prisão. Além disso, as autoridades condenadas terão que indenizar a vítima. Em caso de reincidência, também pode haver a inabilitação para exercício da função pública por um a cinco anos e até mesmo a perda do cargo.
— Este projeto é o maior avanço do garantismo jurídico em décadas no Brasil — disse Requião, ao defender a aprovação do texto em Plenário. Ele também afirmou que o projeto não visa prejudicar os trabalhos da Polícia Federal e do Ministério Público, e garantiu que apoia “investigações limpas”. O relator da proposta afirmou, ainda, que os juízes brasileiros têm qualidade e são “tão bons e tão ruins quanto os membros do Congresso”.
Entre as práticas classificadas como abuso de autoridade no substitutivo de Requião estão: obter provas por meios ilícitos; entrar em imóvel alheio sem determinação judicial; impedir encontro reservado entre um preso e seu advogado; decretar a condução coercitiva de testemunha ou investigado sem intimação prévia; fotografar ou filmar um preso sem o seu consentimento ou para expô-lo a vexame; e colocar algemas no detido quando não houver resistência à prisão.
O projeto prevê também punição para a popular “carteirada” — o ato de uma autoridade fazer uso do seu cargo para exigir vantagem ou privilégio indevido. Também será punida a autoridade que procurar colocar obstáculos à análise de um processo ao pedir vista por tempo excessivo, impedindo que ele seja apreciado pelo órgão colegiado ao qual ela pertence.
O texto aprovado foi produzido por Requião, a partir de duas proposições que tramitavam no Senado: o PLS 280/2016, que era o objeto original dos debates sobre esse tema no Senado, do senador Renan Calheiros (PMDB-AL); e o PLS 85/2017, apresentado pelo senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP), que se originou de uma série de sugestões elaboradas pelo Ministério Público Federal.
A Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ) havia aprovado o projeto por unanimidade na manhã desta quarta-feira, após a retirada do, texto, do chamado "crime de hermenêutica". O substitutivo então foi ao Plenário em regime de urgência para que tivesse a sua análise concluída no mesmo dia.
Caso o projeto seja aprovado também pela Câmara dos Deputados, será revogada a atual legislação sobre abuso de autoridade, a Lei 4.898/1965.

Hermenêutica

Muito criticada por juízes e procuradores do Ministério Público, a proposta também enfrentou oposição de diversos senadores até que se obtivesse apoio para aprová-la na CCJ e no Plenário.
Isso só aconteceu depois que Requião, retirou do texto o risco do chamado “crime de hermenêutica” (punir um juiz por uma interpretação da lei que fosse revertida em instância superior) e a possibilidade de ações penais privadas a qualquer momento contra os crimes descritos.
O consenso alcançado na CCJ, onde houve aprovação unânime, foi destacado pelo presidente do Senado, Eunício Oliveira, que elogiou a articulação ampla entre os partidos e também com o Ministério Público. Ele também classificou o abuso de autoridade como uma “excrescência”.
Ao defender o projeto no Plenário, Requião afirmou que as instituições da República precisam se vigiar umas às outras, e que a aprovação do texto significava uma vitória da legalidade.
— [Esta votação] vai marcar a história do Senado na luta pelas garantias civilizatórias do Direito no Brasil — comemorou.

Lava Jato

Senadores que criticaram o substitutivo, como Cristovam Buarque (PPS-DF), Reguffe (sem partido-DF) e Magno Malta (PR-ES) — manifestaram preocupação com sua influência sobre os rumos da Operação Lava Jato, da Polícia Federal, que investiga esquemas de corrupção no poder público federal e tem diversos parlamentares e ministros como alvo.
Randolfe Rodrigues, que encampou as reivindicações do Ministério Público ao apresentar o PLS 85/2017, elogiou a disposição de Requião em negociar e o trabalho da CCJ, que produziu um texto melhor do que o projeto original. No entanto, ressaltou que algumas normas mantidas na redação final podem impor obstáculos excessivos ao trabalho de magistrados e procuradores.
Cristovam Buarque (PPS-DF) apontou diversos trechos com subjetividade, em práticas que o texto classifica como "crimes de abuso de autoridade". E lamentou a falta de mais dispositivos voltados para os próprios parlamentares. Ele considerou um “erro gravíssimo” colocá-lo em pauta e disse que o fato de o Congresso nunca ter discutido esse assunto antes das ações da Polícia Federal mostra que os senadores estão trabalhando para si mesmos.
— Não cometamos o abuso de autoridade de aprovar esse projeto em causa própria. Está claro que ele tem a ver com a Lava Jato.Vamos inviabilizar o trabalho de juízes, procuradores e polícia. Nenhum de nós está livre de ser denunciado amanhã. Eu quero me defender na Justiça, não impedindo a Justiça. Eu me nego [a votar].
O senador Jorge Viana (PT-AC) disse entender que houve “manipulação” da opinião pública ao longo dos debates sobre esse projeto, para que se estabelecesse a impressão de que ele tem como foco a Lava Jato. Ele disse que se trata apenas de superar a norma antiga, que, na sua opinião, não serve mais ao país.
Líder do DEM, o senador Ronaldo Caiado (GO) endossou o acordo que permitiu a aprovação do texto na CCJ, celebrando a retirada do "crime de hermenêutica". Ele argumentou que o substitutivo é resultado de amplos debates, salientando que a subjetividade apontada pelos críticos não compromete a matéria, já que em seu caput fica claro que o abuso se daria apenas em caso de interesse próprio da autoridade em questão, ou de perseguição pessoal.
Agência Senado (Reprodução autorizada mediante citação da Agência Senado)
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